São muitas as expectativas sobre o desempenho da economia brasileira para o ano que vem. As estimativas vão de um crescimento moderado, tal como foi nos últimos dois anos, a uma atividade com maior tração que os anos de 2017, 2018 e 2019.
Segundo o boletim Focus do Banco Central, o mercado espera que em 2020 a economia brasileira cresça 2,3%. Se confirmadas as estimativas, será o maior crescimento desde 2013, quando a economia cresceu 3,0%. Bem, e de onde, enfim, viria ‘tamanho’ crescimento? O mercado tem uma aposta, a construção civil, mas o mercado está certo? E o Boletim Focus? Será um novo ano de frustração das expectativas?
Acompanhe!
O problema das estimativas
É inegável que a economia brasileira terminará o ano de 2019 de forma mais animadora do que começou. Portanto, apesar dos problemas políticos que não são poucos, pelo menos desde o ano de 2012, o país pode sim estar de frente a uma nova oportunidade de crescimento.
O que cabe destacar aqui é o fator da euforia pela crença e nada mais. No começo de 2016 muitos bancos, corretoras, economistas e afins, estavam muito entusiasmados com os resultados dos indicadores de confiança – medidos pela Fundação Getúlio Vargas – que, após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, não tardaram a indicar que a economia finalmente haveria de crescer.
Então, empresas e pessoas passaram a acreditar em dias melhores, ainda que a situação do momento não indicasse nenhum tipo de melhora no curto e média prazo. O que é isso? Crença, nada mais.
Na primeira divulgação do Boletim Focus de 2015 a expectativa de crescimento para o ano corrente era de +0,5%, mas naquele ano a economia recuou 3,5%. Na primeira leitura de 2016 a expectativa era de crescimento de 0,86%, caímos 3,3%. Em 2018 a expectativa era de crescimento de 2,69%, crescemos 1,06% e em 2019, a primeira estimativa do Boletim apontava para um crescimento de 2,53%, talvez cresçamos 1,3%.
A construção civil é a alternativa viável?
O setor de construção civil seria um instrumento importante na criação de um ciclo virtuoso que nos levasse de volta ao crescimento mais robusto e sustentado.
Para saber do poder do setor basta lembrar do Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV) na ocasião da crise do subprime. A iniciativa que, segundo o governo visava diminuir o déficit habitacional no Brasil, serviu de importante ferramenta anticíclica para a economia brasileira.
Segundo o Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP), em junho de 2019 foram vendidas 6.319 unidade habitacionais novas. Não há nenhum registro, desde 2004 de número mensal tão elevado quanto este.
De janeiro a outubro de 2019 foram vendidas pouco mais de 33.850 novas unidades, No mesmo período do ano passado foram vendidas 20.880. Em 2017 pouco mais de 14.790 e em 2016 pouco mais de 12.324.
Ter a construção civil como indutora do crescimento econômico seria relevante para a economia brasileira neste momento. O setor apresenta o maior multiplicador entre todos os demais setores da economia, ou seja, vender imóveis significa movimentar as empresas que produzem cimento, aço, madeira, alumínio, além das variadas empresas do ramo de serviços no pré e pós-venda de cada unidade.
A propósito, com o elevado grau de capacidade ociosa da economia nacional, restaram poucas alternativas ligadas à área de investimentos para poder voltar a crescer.
Quais os principais problemas ?
Os problemas inerentes a este tipo de ‘aposta’ de crescimento a partir de 2020 são extremamente variados e importantes.
Podemos começar pelo problema do juro ‘baixo’ no Brasil. A despeito de ainda termos uma das taxas de juro real mais altas do mundo, para o padrão brasileiro a taxa básica de juros encontra-se em patamares sensivelmente baixos.
O volume de recursos que antes era enviado ao setor financeiro, graças aos retornos exorbitantes de títulos públicos, por exemplo, agora tem que encontrar novas formas, rentáveis, de aplicação.
A suspeita é de que, na ausência de ganhos extraordinários no mercado financeiro, o capital especulativo tenha extravasado para o setor imobiliário, não fazendo crer que um movimento de especulação seja, enfim um suspiro da economia nacional.
Não se trata aqui de negar que a economia possa de fato ter entrado um momento um pouco melhor do que temos visto nos últimos, anos, nem tampouco tentar criar teorias da conspiração. Mesmo que o crescimento seja fruto de um movimento mais amplo, de cunho especulativo, ainda assim os resultados disso são, em alguma medida, bons para a economia nacional.
O intuito aqui é, portanto, tentar mensurar o quanto disso é parte da retomada da economia nacional e quanto é só o movimento da capital especulativo procurando novas formas de se multiplicar.
Voltando aos nossos possíveis problemas, a concentração de mercado vem à tona novamente.
Ao menor sinal de retomada mais robusta da economia, os empresários tentarão – com razão – converter esse volume na maior quantidade de recursos possível, e o resultado prático disso em uma economia cujos setores são dramaticamente concentrados é a volta de algum aumento mais sistemática do índice de preços.
Não se trata aqui de imaginar um descontrole inflacionário, isso, até aqui, está totalmente fora de questão, mas imaginar patamares um pouco mais elevados para a inflação nos próximos anos é bastante plausível.
Patamares mais altos de inflação requerem patamares mais elevados de taxa de juros, daí, seja qual for o indutor do crescimento do mercado imobiliário, perderá o ímpeto.
Perspectivas
A promessa de um 2020 muito melhor que o nosso combalido 2019 não pode ser confundida com o que de fato pode ser entregue pela nossa capacidade produtiva.
Sim, nós podemos encontrar crescimentos mais robustos em âmbito econômico, no entanto, existem fatores que jogam contra esse crescimento – diminuição da demanda agregada por parte do governo – e existem elementos estranhos ao Brasil, como é o caso da Selic em 4,5%.
O segundo semestre de 2019 foi surpreendentemente positivo, até mesmo as vendas do natal foram sensivelmente melhores. No entanto, o que temos para 2020, por enquanto, são apenas promessas de dias melhores.
Veremos!
— André Galhardo é economista-chefe da Análise Econômica Consultoria, professor e coordenador universitário nos cursos de Ciências Econômicas. Mestre em Economia Política pela PUC-SP, possui ampla experiência em análise de conjuntura econômica nacional e internacional, com passagens pelo setor público.
Clique aqui e acesse o link da reportagem.